quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Juvenal, o Sombra e os vaselinas

Eduardo Uram: o dono de três entre os cinco nomes do pacotão são-paulino

Há um motivo de esperança de dias melhores no Morumbi. Não é o trabalho de Emerson Leão, não são os dribles de Lucas, os gols de Luís Fabiano ou as defesas de Rogério Ceni. Também não é a versão 2012 do pacotão de reforços, claro. A esperança é porque Dagoberto já está bem distante, mais precisamente no Beira-Rio. A felicidade é tão grande que a direção fez questão de anunciar os valores: por R$ 2,2 milhões, ele será do Internacional no próximo ano.

Dagoberto é o grande símbolo dos jogadores que, em sua impagável e inflamada entrevista na terça-feira, Juvenal Juvêncio intitulou vaselina. Dagoberto é um vaselina no São Paulo há bastante tempo. Minou treinadores, fez atritos, jogou quando quis, sumiu quando quis. Uma diálogo flagrado por Sérgio Baresi entre ele e Marlos marcou sua passagem pelo time principal em 2010: "não te falei que eu ia dar migué? Ia e dei mesmo", disse Dago no vestiário. Sem retaguarda, Baresi sacou o vaselina, mas o ambiente era terrível e ele terrivelmente cru.

O São Paulo de 2012 não terá um treinador verde, muito pelo contrário. Emerson Leão, sem multa rescisória e sob a sombra de Paulo Autuori para maio, precisará mostrar muito mais do que no último Campeonato Brasileiro. Para isso, terá reforços de personalidade, especialmente Fabrício, que chegam com a missão de mudar o ambiente e a atitude da equipe em campo - sem Dagoberto e certamente sem Marlos, a tarefa fica mais acessível. Juan, Casemiro e Henrique, que também se enquadram no perfil de vaselina, estão na alça de mira.

A incógnita, se já não bastasse os últimos terríveis trabalhos de Leão, é a qualidade do time a se formar. Os reforços chegam com o carimbo de Eduardo Uram, empresário que dominou o futebol carioca no início da década e trabalhava com mais de 15 jogadores do Figueirense. Se o São Paulo de 2005 a 2010 era de Juan Figger, hoje é de Uram. Apelidado de Sombra por sua discrição nos bastidores, ele foi quem intermediou os contratos de Maicon, Edson Silva e Cortês. Eles se juntam a Cícero, Juan, João Filipe e Luiz Eduardo. Sete jogadores do mesmo agente.

Ter muitos nomes do mesmo empresário dentro do elenco, o ex-diretor de futebol Juvenal Juvêncio sabe que é sempre um perigo. Daí sua implicância quando Marlos, Dagoberto e Miranda, de Marcos Malaquias, estavam juntos em campo. A aproximação de Uram se deu na ascensão de Adalberto Baptista, do marketing ao futebol, e já rendeu um fruto. Luiz Eduardo, promessa de Cotia para a defesa, assinou com o agente, que pela segunda temporada consecutiva transformou o Orlando Scarpelli em um grande supermercado da bola.

Cristóvão Borges, que comandou o inesquecível Vasco-2011, costumava dizer na reta final da temporada: o mais difícil não é montar um time forte, mas sim construir um grupo. Desde que Muricy Ramalho deixou o Morumbi, o São Paulo, com seus vaselinas, com os jovens e com os pacotões, reúne bons jogadores, mas nunca tem uma equipe de verdade. A versão 2012, com Emerson Leão, não passa segurança até aqui.

sábado, 17 de dezembro de 2011

O que ensinam os campeões – parte 2


De novo Muricy Ramalho é personagem desse texto como encerramos os comentários sobre a temporada 2010. Na manhã do domingo, quando os brasileiros vão acordar cedo e recordar o pentacampeonato de 2002, Santos e Barcelona entram em campo para decidir o título mundial de clubes. O mesmo Estádio Internacional de Yokohama daquela final vai mostrar um jogo aguardadíssimo entre dois times que, em comum, só têm o fato de ter gênios da bola como protagonistas.

Grandes campeões continentais na temporada, Barcelona e Santos, segundo seus treinadores, enxergam o futebol de forma muito distinta. Curiosamente, são em seus países os times mais elogiados por suas categorias de base, justamente de onde saem todos os craques da decisão: Ganso e Neymar de um lado, Messi, Xavi, Fabregas e Iniesta do outro. Na prática, os times jogam e costumam vencer sob paradigmas opostos.

Em entrevistas, Muricy tem dito que o Santos precisará agredir o Barcelona e tentar equilibrar as ações, mas sequer conseguiu ter mais posse de bola que o atual campeão japonês: 52% para o Kashiwa Reysol, 48% para o time que tem Neymar e Ganso. O Barça, sim, sabe como fazer isso. Jogou com só dois titulares do meio para a frente e, diante do modesto Al Sadd, teve a bola em 75% do tempo.

Muricy diz também que Guardiola só poderia ser chamado de melhor do mundo caso tivesse sucesso no futebol brasileiro. Será que o santista faria o Barcelona jogar como o adversário? Difícil imaginar um centroavante de 1,69 m a serviço de Muricy, um lateral como Daniel Alves ou um time sem zagueiros.

Messi ou Ibra: quem seria seu centroavante, Muricy?

Pep prefere manter a posse e faz seus jogadores mais ofensivos marcarem como volantes carrapatos, o que talvez seja o maior segredo para uma equipe revolucionária. Não é a posse de bola espantosa o diferencial do Barcelona, mas sim a sede por roubá-la e iniciar a jogada seguinte. Muricy a oferece para os adversários e aposta nos passes de Ganso, na individualidade de Neymar e na finalização de Borges. Seu time não tem volume, não controla, não domina. Vence boa parte das vezes, claro.

As discussões em torno do Barcelona, mais uma vez frequentes no Footecon 2011, raramente tocam os pontos mais marcantes. Não é só a posse de bola, mas a capacidade de desmarcação dos jogadores e, essencialmente, como se desarma com sede, organização e facilidade. A bola não fica no pé só porque o passe é qualificado, mas porque é rapidamente recuperada. Muricy, após o jogo contra o Kashiwa, admitiu os problemas em sua defesa porque “Neymar não pode marcar”. Deveria observar o comportamento de Messi sem bola.

No Campeonato Brasileiro de 2011, o campeão Corinthians e os outros quatro melhores colocados (Vasco, Fluminense, Flamengo e Inter) estão entre os sete que mais desarmam na competição. A estatística passa a mensagem de que marcar de forma competente é um princípio quase decisivo para recuperar a posse de bola, jogar, fazer gols e vencer. Líder em roubadas, o Palmeiras teve campanha medíocre porque não basta desarmar, é preciso converter.

A equipe de Tite foi referência pela capacidade em roubar a bola sem cometer faltas e por atacar com intensidade. Inúmeros gols do Corinthians no Brasileiro surgem com desarmes, como nas vitórias sobre Ceará e Atlético-MG, momentos chaves na reta final da Série A. O ponto baixo do campeão foi não controlar os nervos, aflorados pelo início de campanha bem acima da expectativa. Mais frio e consciente, poderia ter vencido sem tantos percalços.

O grande mérito do treinador corintiano, reconhecido por ele próprio, é fazer seu time jogar de maneira coletiva, com e sem a bola. É outro ponto chave do Barcelona e também da Alemanha, seleção do momento até pela estafa natural dos espanhóis. A solidariedade sem a posse, o jogo de passes e as movimentações em campo são de uma equipe que joga em conjunto desde que tinha Fritz Walter como capitão e Sepp Herberger como treinador.


Eles merecem

Atuar coletivamente é muito mais que ter raça e entrosamento e não combina com esse Santos, também merecedor do título porque tem jogadores raros como Ganso e Neymar, trabalhadores como Rafael, Arouca, Danilo, Durval e Léo, líderes como Edu Dracena e Elano. O Mundo Deportivo deste sábado usa o título “maestros do contragolpe”. Mais que um estilo de jogo, uma escolha do treinador.


- Texto de 2010: o que ensinam os campeões